Escrever a leitura: a aula
Em um texto de Roland Barthes que foi lido para o curso correntes literárias deste
semestre, ele encontrou esse dito poético de Mallarmée que será o mote desses escritos
sobre escrever a leitura : a aula : “O homem pode ser democrata, o artista se desdobra e
deve permanecer aristocrata.”
No referido curso que ele denominou “ a aula”, um dos temas recorrentes foi sobre o
engajamento literário , ou o que seria tal engajamento. Ele não sabe o que é esse
engajamento, ou sabe, mas a partir da margem esquerda da estrada: isso é uma imagem.
Seu engajamento. Ou seja, só é possível falar de literatura à beira do caminho, como
leitor que ainda não escreveu a leitura. Mas o que seria esse dito de Mallarmée visto da
perspectiva do curso: escrever a leitura: a aula? Não se sabe, ou ele não sabe, então ele
vai dizer do que não sabe na perspectiva do curso.
Quem escreve? um autor? Ou um ex autor? Que foi substituído pela linguagem que
escreve a linguagem, ou seja, a linguagem falando de si mesma, se reescrevendo
perpetuamente. A linguagem sempre é aristocrata. Um engajamento aristocrata é um
não sei o quê; é, mas não se define por um conceito; só uma imagem poética seria capaz
de dizer esse “não sei o quê”.
A busca do tempo perdido , romance escrito por Marcel Proust, deu a ele uma
imagem, isto é, a prosa da Busca tem seus elementos poéticos, que no dizer de Barthes,
são instantâneos da obra, seu momento de Haicai: quando há no Romance como que
interrupções da narrativa: Ele senta à beira da estrada, fatigado de tanto andar, mas feliz
por ter a oportunidade de captar uma imagem poética. Descobre no fundo da sua
mochila de lona de caminhão, sua polaroide carcomida pelo tempo, e fotografa essa
imagem:
__ Em todo caso, se esse Dreyfus é inocente __ interrompe a duquesa __, ele não a
prova de maneira alguma. Que cartas idiotas, enfáticas, escreve lá da sua ilha! Não sei
se o senhor Esterhazy vale mais do que ele, mas tem outra elegância na maneira de
compor as frases, outro colorido. Isso não dever causar prazer aos partidários do
senhor Dreyfus. Que desgraça para eles não poderem mudar de inocente! (PROUST, p.
264, Caminho dos Guermantes).
Aqui é preciso um esclarecimento do contexto a que se refere a personagem do
romance, Oriane. Dreyfus e Esterhazy são generais do exercito Francês no inicio do
século XX; Dreyfus é judeu, e foi condenado à prisão na Ilha do Diabo, por ter sido
acusado de ser espião da Alemanha na guerra em questão. A historia inocentou Dreyfus,
mas não condenou Esterhazy, que supostamente incriminou Dreyfus falsificando um
documento. No contexto do Romance o caso Dreyfus era o principal assunto dos jornais
franceses. As personagens do Romance estão reunidas no salão da sra. Villeparisis, e o
assunto deles também era o caso do general judeu condenado injustamente. A
aristocracia reunida no salão, era anti- Dreyfus por preconceito de casta, mas havia
alguns pró- Dreyfus, o narrador, por exemplo. Oriane, que também era aristocrata, pois
era uma Guermantes, como gostava de chocar as opiniões, não tomava partido nem por
um, nem por outro. Ela era pela poesia. Ou seja, quando ela diz que gostaria que
trocassem de inocente, foi por ter lido as cartas de ambos, e considerar que as cartas do
general Esterhazy eram muito bem escritas, a ponto de acha-las poéticas: “condenou”
Dreyfus por achar suas cartas enfadonhas.
Para ele, Oriane simboliza a poesia, a literatura e o artista, que permanecem
aristocratas, quando a mulher é democrata. Não é uma questão da arte pela arte. A
mulher ou homem, seres constituídos socialmente servem, ao artista, seus braços, o
papel, a tinta e a pena, à obra, que é aristocrata. Aqui há um paradoxo, uma antítese:
democracia diferente de aristocracia: o produto da democracia= obra
literária=aristocrata. Se assim não fosse, a democracia não seria capaz de dar-nos uma
obra literária, visto que literatura é diferente de democracia. A aristocracia é “ ...mas
tem outra elegância na maneira de compor as frases, outro colorido”. Ao passo que a
democracia seria: “ Que cartas idiotas, enfáticas, escreve lá da sua ilha!”.
Quem escreve não tem domínio sobre sua escrita, pois um escrevente não é capaz de
dar todos os sentidos para seu texto, isso quem vai dar são todos os leitores do texto.
Sendo assim, são os leitores que escreverão a leitura, e assim sucessivamente até ao
infinito. Os sentidos se multiplicarão em outros sentidos, em outras obras, ou escritas.
Romances há que serão lidos por leitores que, a partir daí, produzirão outros romances;
romances lidos que darão motes para poesias: ou mesmo poesias que serão assunto para
a produção de filmes; ou filmes nascidos de romances. Ou ainda, como no dizer de
Barthes: o momento de levantar a cabeça: no ato da leitura o leitor para, levanta a
cabeça, e do turbilhão de ideias ou imagens advindas do teor do que se leu, nascem
imagens outras que não serão transformadas em novos escritos, mas só aquele
alumbramento poético da leitura prazerosa: o prazer do texto. Ler para não escrever. A
poesia é a própria leitura: é a imagem captada em uma frase, ou palavras poéticas:
Proust e suas palavras poéticas: Cristo, Dilúvio e Bárbaros.
Dentro da proposta do curso, ele vai escrever sua leitura, ou seja, como estudante de
Letras da Unifesp, eis suas imagens produzidas durante o curso de teoria literária deste
semestre: primeiro dois Haicais, quando da leitura do primeiro volume da “ Preparação
do romance”, de Barthes, e uma poesia imaginada durante as aulas:
Seu primeiro Haicai:
Um maçarico
Na Canastra
Acende um cachimbo
Segundo Haicai:
Meia-noite
Um vaga-lume
Acende a candeia
A poesia:
Os maçaricos são azuis
Por viver muitos anos na estrada,
Itaobim pegou um olhar desviante.
Daí que via o azul na canção dos 111s.
Daí ele imaginar ver as horas nos olhos dos gatos.
Daí que as placas: 80 km, eram metáforas sonhadas na infância.
Daí que ele via o inefável nos sons produzidos à beira da estrada.
Um Scania 113 h subindo a serra do Cachimbo está cantando uma canção que o faz ter
um alumbramento: vê as andorinhas fazendo uma coreografia de despedida, no céu.
O sol azul se levanta, e a Jaó canta: “vamos desbreganhar o negócio? A Perdiz
responde: “ eu, nunca mais!
Daí que Itaobim exclama:
__ Que saudades da minha infância, da aurora às margens da estrada!
Quando FNMs me acordavam com seu brado de bárbaro bonachão, e os Scanias me
nanavam com a sinfonia afinadíssima de seus motores 360 hp em ré menor.
Ele achou uma imagem capaz de sintetizar toda a teoria sobre o dito de Mallarmée: Foi
na Busca de Proust: mas isso é a leitura que ele faz do dito enigmático de Mallarmée.
Essa imagem é um instantâneo , um “isso” e pode também ser a “nuance” de que
Barthes teorizou. A nuance também é um momento poético da prosa, quando uma
imagem é eternizada pela polaroide do poeta. Exposição fotográfica da Primeira Guerra
Mundial, em Paris:
O narrador da Busca sai de sua casa à noite: talvez meia-noite. Ele não lembra
exatamente. Visita um hotel que durante a ocupação alemã, tornou-se um local
emblemático, com um quê de sinistro, devido aos hospedes que ali se hospedavam:
herói de guerra, espiões, cocotes, e toda sorte de “marginais” de guerra. Entre esses
hospedes o narrador encontra o Barão de Charlus, com quem Marcel tem uma longa
conversa, na qual descobre no Barão. um herói da Guerra. Sai de lá emocionado pela
conversa. Neste momento os aviões germânicos invadem o céu de Paris, com isso o
narrador tem talvez seu alumbramento mais sublime de toda a Busca: o “isso” de que
nos fala Barthes, é ali metaforizado por uma imagem pungente: é como que se lêssemos
um epigrama do poeta Mario Quintana, dentro da Busca. Pois assim nos descreve
Marcel aquela visão celestial: Os aviões sobrevoando Paris, entremeados por estrelas do
céu limpo da cidade, era como se uma nova Via láctea fosse descoberta naquele
momento. Os aviões seriam as estrelas desta nova Via láctea poética. E isso é o
instantâneo. A nuance de que nos fala Barthes. Paris está ocupada pelos alemães, o povo
Francês vivendo os horrores da guerra, mas assim mesmo, o artista foi capaz de captar
uma imagem poética neste contexto hostil. Assim, o artista se desdobra a fim de captar
uma imagem que mesmo sendo da Guerra, não é a Guerra, é a poesia. É o que há de
poético, mesmo na Guerra.
Escrever a leitura: o amor
Lendo o texto do Barthes “ Fracassamos sempre em falar do que amamos”, me veio
umas questões literárias sobre o amor. Após esta leitura, houve a aula, a ultima aula do
curso, na qual houve referência a Gide, romancista dos “Moedeiros Falsos”. E como
esse texto é pensado na perspectiva do curso de teoria literária , e como foi teorizado o
amor na literatura, é necessário escrever sobre isso.
Para ele, um dos grandes momentos da literatura quando o assunto é o amor, quem
nos dá é Gide, pois em um de seus livros autobiográfico, Gide consegue convencer de
que a literatura também pode falar do que amamos, mas não só: só ela seria capaz de
dizer o amor de forma pungente. Ou seja: a linguagem literária consegue dizer o “isso”
do amor. E o “isso” do amor em Gide, é seu amor por sua prima. Isso é: lendo esta
autobiografia ele conheceu uma face desconhecida do amor, mas descobriu que essa
face desconhecida era sua própria face: a literatura é capaz de falar do que amamos.
O assunto principal, ou o mote do conteúdo do texto do Barthes que fala sobre: o
fracasso de falar do que amamos , é Sthendal. O amor em Sthendal. Roland Barthes
nos fala sobre a viagem de Sthendal pela Itália; fala sobre seu amor por aquele país, e
também fala de como Sthendal achava as italianas belas. E tudo isso é comentado um
texto que Sthendal escreveu sobre seu amor pela Itália. Um texto tipo diário, que
Barthes denominou “O álbum” . O álbum é diferente de literatura. Nele Sthendal
escreveu suas impressões da Itália. Seu amor pela arte italiana, pelas mulheres, pela
comida, pela música e pelas festas. Mas ao fazer isso, Sthendal fracassa. Já que,
segundo Barthes, ele não nos convence literariamente sobre seu amor “italiano”. Ou
seja, o Álbum, não sendo um texto literário, não é capaz de dizer o amor de Sthendal.
Contudo, se o romancista fracassa ao falar do seu amor pela Itália, no Álbum, em
compensação em seus romances, ele nos convence. Ou seja, nos textos literários, que
são seus grandes romances como o “Vermelho e negro” e a “Cartuxa de Parma”, por
exemplo; conhecemos de Sthendal tudo o que diz respeito ao seu amor pela Itália,
principalmente pela mulheres italianas.
E em uma personagem da “Cartuxa”, a condessa Sanseverina, eu conheci o que é uma
personagem romanesca amar de verdade: minha impressão de leitura da Cartuxa é que
Sanseverina não diz que ama Fabrice, mas ele deu-me a maior poesia amorosa de todos
os textos de literatura que eu já li. Nunca encontrei esse amor em Balzac, nem em
Proust. Proust sugere que sua personagem Oriane tem um quê de Sanseverina, mas esse
quê não é o amor. Talvez seja a beleza, já que em Oriane eu não conheci o amor: Oriane é a ironia. Sanseverina é o amor. E que amor.
Em um texto de Roland Barthes que foi lido para o curso correntes literárias deste
semestre, ele encontrou esse dito poético de Mallarmée que será o mote desses escritos
sobre escrever a leitura : a aula : “O homem pode ser democrata, o artista se desdobra e
deve permanecer aristocrata.”
No referido curso que ele denominou “ a aula”, um dos temas recorrentes foi sobre o
engajamento literário , ou o que seria tal engajamento. Ele não sabe o que é esse
engajamento, ou sabe, mas a partir da margem esquerda da estrada: isso é uma imagem.
Seu engajamento. Ou seja, só é possível falar de literatura à beira do caminho, como
leitor que ainda não escreveu a leitura. Mas o que seria esse dito de Mallarmée visto da
perspectiva do curso: escrever a leitura: a aula? Não se sabe, ou ele não sabe, então ele
vai dizer do que não sabe na perspectiva do curso.
Quem escreve? um autor? Ou um ex autor? Que foi substituído pela linguagem que
escreve a linguagem, ou seja, a linguagem falando de si mesma, se reescrevendo
perpetuamente. A linguagem sempre é aristocrata. Um engajamento aristocrata é um
não sei o quê; é, mas não se define por um conceito; só uma imagem poética seria capaz
de dizer esse “não sei o quê”.
A busca do tempo perdido , romance escrito por Marcel Proust, deu a ele uma
imagem, isto é, a prosa da Busca tem seus elementos poéticos, que no dizer de Barthes,
são instantâneos da obra, seu momento de Haicai: quando há no Romance como que
interrupções da narrativa: Ele senta à beira da estrada, fatigado de tanto andar, mas feliz
por ter a oportunidade de captar uma imagem poética. Descobre no fundo da sua
mochila de lona de caminhão, sua polaroide carcomida pelo tempo, e fotografa essa
imagem:
__ Em todo caso, se esse Dreyfus é inocente __ interrompe a duquesa __, ele não a
prova de maneira alguma. Que cartas idiotas, enfáticas, escreve lá da sua ilha! Não sei
se o senhor Esterhazy vale mais do que ele, mas tem outra elegância na maneira de
compor as frases, outro colorido. Isso não dever causar prazer aos partidários do
senhor Dreyfus. Que desgraça para eles não poderem mudar de inocente! (PROUST, p.
264, Caminho dos Guermantes).
Aqui é preciso um esclarecimento do contexto a que se refere a personagem do
romance, Oriane. Dreyfus e Esterhazy são generais do exercito Francês no inicio do
século XX; Dreyfus é judeu, e foi condenado à prisão na Ilha do Diabo, por ter sido
acusado de ser espião da Alemanha na guerra em questão. A historia inocentou Dreyfus,
mas não condenou Esterhazy, que supostamente incriminou Dreyfus falsificando um
documento. No contexto do Romance o caso Dreyfus era o principal assunto dos jornais
franceses. As personagens do Romance estão reunidas no salão da sra. Villeparisis, e o
assunto deles também era o caso do general judeu condenado injustamente. A
aristocracia reunida no salão, era anti- Dreyfus por preconceito de casta, mas havia
alguns pró- Dreyfus, o narrador, por exemplo. Oriane, que também era aristocrata, pois
era uma Guermantes, como gostava de chocar as opiniões, não tomava partido nem por
um, nem por outro. Ela era pela poesia. Ou seja, quando ela diz que gostaria que
trocassem de inocente, foi por ter lido as cartas de ambos, e considerar que as cartas do
general Esterhazy eram muito bem escritas, a ponto de acha-las poéticas: “condenou”
Dreyfus por achar suas cartas enfadonhas.
Para ele, Oriane simboliza a poesia, a literatura e o artista, que permanecem
aristocratas, quando a mulher é democrata. Não é uma questão da arte pela arte. A
mulher ou homem, seres constituídos socialmente servem, ao artista, seus braços, o
papel, a tinta e a pena, à obra, que é aristocrata. Aqui há um paradoxo, uma antítese:
democracia diferente de aristocracia: o produto da democracia= obra
literária=aristocrata. Se assim não fosse, a democracia não seria capaz de dar-nos uma
obra literária, visto que literatura é diferente de democracia. A aristocracia é “ ...mas
tem outra elegância na maneira de compor as frases, outro colorido”. Ao passo que a
democracia seria: “ Que cartas idiotas, enfáticas, escreve lá da sua ilha!”.
Quem escreve não tem domínio sobre sua escrita, pois um escrevente não é capaz de
dar todos os sentidos para seu texto, isso quem vai dar são todos os leitores do texto.
Sendo assim, são os leitores que escreverão a leitura, e assim sucessivamente até ao
infinito. Os sentidos se multiplicarão em outros sentidos, em outras obras, ou escritas.
Romances há que serão lidos por leitores que, a partir daí, produzirão outros romances;
romances lidos que darão motes para poesias: ou mesmo poesias que serão assunto para
a produção de filmes; ou filmes nascidos de romances. Ou ainda, como no dizer de
Barthes: o momento de levantar a cabeça: no ato da leitura o leitor para, levanta a
cabeça, e do turbilhão de ideias ou imagens advindas do teor do que se leu, nascem
imagens outras que não serão transformadas em novos escritos, mas só aquele
alumbramento poético da leitura prazerosa: o prazer do texto. Ler para não escrever. A
poesia é a própria leitura: é a imagem captada em uma frase, ou palavras poéticas:
Proust e suas palavras poéticas: Cristo, Dilúvio e Bárbaros.
Dentro da proposta do curso, ele vai escrever sua leitura, ou seja, como estudante de
Letras da Unifesp, eis suas imagens produzidas durante o curso de teoria literária deste
semestre: primeiro dois Haicais, quando da leitura do primeiro volume da “ Preparação
do romance”, de Barthes, e uma poesia imaginada durante as aulas:
Seu primeiro Haicai:
Um maçarico
Na Canastra
Acende um cachimbo
Segundo Haicai:
Meia-noite
Um vaga-lume
Acende a candeia
A poesia:
Os maçaricos são azuis
Por viver muitos anos na estrada,
Itaobim pegou um olhar desviante.
Daí que via o azul na canção dos 111s.
Daí ele imaginar ver as horas nos olhos dos gatos.
Daí que as placas: 80 km, eram metáforas sonhadas na infância.
Daí que ele via o inefável nos sons produzidos à beira da estrada.
Um Scania 113 h subindo a serra do Cachimbo está cantando uma canção que o faz ter
um alumbramento: vê as andorinhas fazendo uma coreografia de despedida, no céu.
O sol azul se levanta, e a Jaó canta: “vamos desbreganhar o negócio? A Perdiz
responde: “ eu, nunca mais!
Daí que Itaobim exclama:
__ Que saudades da minha infância, da aurora às margens da estrada!
Quando FNMs me acordavam com seu brado de bárbaro bonachão, e os Scanias me
nanavam com a sinfonia afinadíssima de seus motores 360 hp em ré menor.
Ele achou uma imagem capaz de sintetizar toda a teoria sobre o dito de Mallarmée: Foi
na Busca de Proust: mas isso é a leitura que ele faz do dito enigmático de Mallarmée.
Essa imagem é um instantâneo , um “isso” e pode também ser a “nuance” de que
Barthes teorizou. A nuance também é um momento poético da prosa, quando uma
imagem é eternizada pela polaroide do poeta. Exposição fotográfica da Primeira Guerra
Mundial, em Paris:
O narrador da Busca sai de sua casa à noite: talvez meia-noite. Ele não lembra
exatamente. Visita um hotel que durante a ocupação alemã, tornou-se um local
emblemático, com um quê de sinistro, devido aos hospedes que ali se hospedavam:
herói de guerra, espiões, cocotes, e toda sorte de “marginais” de guerra. Entre esses
hospedes o narrador encontra o Barão de Charlus, com quem Marcel tem uma longa
conversa, na qual descobre no Barão. um herói da Guerra. Sai de lá emocionado pela
conversa. Neste momento os aviões germânicos invadem o céu de Paris, com isso o
narrador tem talvez seu alumbramento mais sublime de toda a Busca: o “isso” de que
nos fala Barthes, é ali metaforizado por uma imagem pungente: é como que se lêssemos
um epigrama do poeta Mario Quintana, dentro da Busca. Pois assim nos descreve
Marcel aquela visão celestial: Os aviões sobrevoando Paris, entremeados por estrelas do
céu limpo da cidade, era como se uma nova Via láctea fosse descoberta naquele
momento. Os aviões seriam as estrelas desta nova Via láctea poética. E isso é o
instantâneo. A nuance de que nos fala Barthes. Paris está ocupada pelos alemães, o povo
Francês vivendo os horrores da guerra, mas assim mesmo, o artista foi capaz de captar
uma imagem poética neste contexto hostil. Assim, o artista se desdobra a fim de captar
uma imagem que mesmo sendo da Guerra, não é a Guerra, é a poesia. É o que há de
poético, mesmo na Guerra.
Escrever a leitura: o amor
Lendo o texto do Barthes “ Fracassamos sempre em falar do que amamos”, me veio
umas questões literárias sobre o amor. Após esta leitura, houve a aula, a ultima aula do
curso, na qual houve referência a Gide, romancista dos “Moedeiros Falsos”. E como
esse texto é pensado na perspectiva do curso de teoria literária , e como foi teorizado o
amor na literatura, é necessário escrever sobre isso.
Para ele, um dos grandes momentos da literatura quando o assunto é o amor, quem
nos dá é Gide, pois em um de seus livros autobiográfico, Gide consegue convencer de
que a literatura também pode falar do que amamos, mas não só: só ela seria capaz de
dizer o amor de forma pungente. Ou seja: a linguagem literária consegue dizer o “isso”
do amor. E o “isso” do amor em Gide, é seu amor por sua prima. Isso é: lendo esta
autobiografia ele conheceu uma face desconhecida do amor, mas descobriu que essa
face desconhecida era sua própria face: a literatura é capaz de falar do que amamos.
O assunto principal, ou o mote do conteúdo do texto do Barthes que fala sobre: o
fracasso de falar do que amamos , é Sthendal. O amor em Sthendal. Roland Barthes
nos fala sobre a viagem de Sthendal pela Itália; fala sobre seu amor por aquele país, e
também fala de como Sthendal achava as italianas belas. E tudo isso é comentado um
texto que Sthendal escreveu sobre seu amor pela Itália. Um texto tipo diário, que
Barthes denominou “O álbum” . O álbum é diferente de literatura. Nele Sthendal
escreveu suas impressões da Itália. Seu amor pela arte italiana, pelas mulheres, pela
comida, pela música e pelas festas. Mas ao fazer isso, Sthendal fracassa. Já que,
segundo Barthes, ele não nos convence literariamente sobre seu amor “italiano”. Ou
seja, o Álbum, não sendo um texto literário, não é capaz de dizer o amor de Sthendal.
Contudo, se o romancista fracassa ao falar do seu amor pela Itália, no Álbum, em
compensação em seus romances, ele nos convence. Ou seja, nos textos literários, que
são seus grandes romances como o “Vermelho e negro” e a “Cartuxa de Parma”, por
exemplo; conhecemos de Sthendal tudo o que diz respeito ao seu amor pela Itália,
principalmente pela mulheres italianas.
E em uma personagem da “Cartuxa”, a condessa Sanseverina, eu conheci o que é uma
personagem romanesca amar de verdade: minha impressão de leitura da Cartuxa é que
Sanseverina não diz que ama Fabrice, mas ele deu-me a maior poesia amorosa de todos
os textos de literatura que eu já li. Nunca encontrei esse amor em Balzac, nem em
Proust. Proust sugere que sua personagem Oriane tem um quê de Sanseverina, mas esse
quê não é o amor. Talvez seja a beleza, já que em Oriane eu não conheci o amor: Oriane é a ironia. Sanseverina é o amor. E que amor.
Comentários